"De tanto
ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver
crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de
ser honesto.” (Ruy Barbosa).
Texto
de Paulo Robert de Almeida (até o item 10):
Proponho-me, neste
curto ensaio analítico, traçar os elementos principais de uma pequena
radiografia da decadência, de maneira a subsidiar, talvez, diagnósticos mais
precisos de situações concretas que possam preocupar os leitores eventuais
deste “manual” de identificação dos sinais precursores de uma decadência
anunciada (não necessariamente percebida). Assim, pode-se saber que um país, ou
uma sociedade, está em decadência quando:
1 - O sentimento de mal-estar se torna
generalizado na sociedade, ainda que possa ser difuso:
O mal-estar que
costuma atingir sociedades e povos em decadência efetiva é mais um resultado
dos próprios processos de “involução” já em curso, do que um sinal precursor
desse itinerário “regressista”. De fato, o sentimento de incerteza quanto ao
futuro costuma perpassar de maneira difusa os diferentes estratos sociais
mobilizados nas atividades correntes da sociedade em questão. A literatura
consegue captar, antes mesmo de diagnósticos “sociológicos”, essa sensação de
desconforto em relação aos padrões vigentes, que é também vista e interpretada
nas artes em geral, por meio de peças e demonstrações de “ruptura” em relação
às normas sociais comumente aceitas e “consumidas” pelos estratos sociais
incluídos nas transações correntes. O sentimento de fin d’une époque,
ou de esgotamento de um “ciclo”, é geralmente percebido pelos espíritos mais
argutos, mas o desconforto com o “estado reinante” das coisas se dissemina de
modo generalizado em camadas mais amplas da sociedade. Ocorre uma desafeição em
relação à cultura predominante, mas não se consegue propor ou viabilizar
padrões ou modelos alternativos que sejam eficientes ou implementáveis. Os
custos da transição para “algo mais racional” são considerados por todos como
muito elevados, em vista dos pactos vigentes, e a sociedade se acomoda na
resignação e no déjà vu.
2 - Os avanços econômicos são lentos, ou
menores, em relação a outros povos e sociedades:
Avanços econômicos
lentos, em perspectiva comparada. A
decadência não significa, necessariamente, retrocesso econômico absoluto ou
mesmo uma deterioração das condições prevalecentes no plano da organização
social da produção. Ao contrário, podem até ocorrer avanços tecnológicos,
progressos científicos e melhoras nos padrões vigentes de produção, tendo em
vista capacidades técnicas e habilidades gerenciais já acumuladas pela
sociedade. Uma sociedade pode avançar, em suas próprias realizações, e mesmo
assim ser ultrapassada relativamente por outras, mais dinâmicas, empreendedoras
e inovadoras. O declínio relativo é geralmente o resultado de uma queda nos
índices de produtividade, a perda progressiva de competitividade, um recuo nos
espaços anteriormente ocupados no âmbito internacional e um lento movimento
para escalões inferiores em rankings setoriais de classificação de
países. Os processos de divergência entre os povos e sociedades resultam,
geralmente, de longas fases de crescimento (ou falta de), mais do que de altas
taxas ocasionais de expansão do produto. O desenvolvimento pode ocorrer pari-passu a
baixas taxas mas sustentadas de crescimento econômico, sendo que expansões
rápidas podem ser contrarrestadas por surtos inflacionários ou crises
sistêmicas que produzem perdas do produto social e erosão do poder de compra da
moeda nacional. O elemento propulsor do processo de desenvolvimento são os
ganhos de produtividade, que produzem, no registro histórico, os fenômenos de
convergência ou de divergência entre os povos e economias nacionais. As
sociedades humanas progrediram muito lentamente durante os milhares de anos de
revolução agrícola neolítica e civilizacional-urbana, para conhecer, dois
séculos e meio de rápidos progressos nos indicadores de bem-estar a partir da
primeira e da segunda revolução industrial. A partir desta, os progressos se
tornaram contínuos, autogerados e induzidos pelo próprio avanço
científico-tecnológico anterior, configurando aquilo que, em termos marxistas,
poderia ser chamado de “modo inventivo de produção”. Este foi, antes de
qualquer outra, uma peculiaridade das sociedades ditas “ocidentais”, mas tende
a se disseminar ao conjunto do planeta, com o término dos obstáculos políticos
ao processo de globalização. Nem todas as sociedades conseguem replicar ou
reproduzir, mesmo por mimetismo, o padrão de progresso tecnológico do Ocidente
desenvolvido. Mas todas elas se encontram, hoje, medianamente dotadas de
condições mínimas para fazê-lo, a partir dos progressos dos meios de
comunicação e de difusão dos conhecimentos científicos (amplamente disponíveis
nos veículos existentes, à diferença do know-how e da
tecnologia proprietária, estes bem mais restritos). O fato de uma sociedade
recuar economicamente, ainda que de modo relativo, pode ser explicado, tão
simplesmente, por sua incapacidade em dotar os seus cidadãos dos requisitos
mínimos de ensino formal e de educação elementar, suscetíveis de os converterem
em “absorvedores” do saber técnico já disponível universalmente nos canais
abertos de difusão de conhecimento. Não se trata aqui, necessariamente, de
padrões de ensino pós-graduado ou especializado, mas basicamente da existência
de ensino fundamental de boa qualidade para o conjunto dos cidadãos.
3 - Os progressos sociais são igualmente
lentos ou repartidos de maneira desigual:
Distribuição desigual dos lentos progressos
sociais alcançados. Comportamentos
“rentistas”, isto é apropriação de bens públicos por grupos organizados que têm
acesso aos canais oficiais de distribuição de recursos, geram um desestímulo à
inovação e à produção pelos agentes econômicos privados. Isso pode ocorrer e
geralmente ocorre no caso da disponibilidade de abundantes recursos naturais :
terras, minérios, commodities primárias que passam a ser
explorados por via de algum tipo de organização estatal, mesmo indireta.
Fala-se da “maldição do petróleo”, por exemplo, como um caso típico de ganhos
fáceis apropriados de maneira desigual por elites que se organizam para
“redistribuir” esses recursos abundantes, o que desvia a atenção dos agentes
privados de investimentos em atividades alternativas toda a atenção passa a ser
focada na “captura” da renda disponível na economia nacional. Mesmo na ausência
de uma fonte abundante de recursos naturais, comportamentos rentistas podem
disseminar entre os estratos dominantes ou dirigentes na sociedade, se a
regulação institucional é feita mais por via estatal do que por meio da própria
sociedade. O Estado sempre constituiu um poderoso meio de redistribuição da
riqueza social para os grupos que o controlam e manipulam em seu favor. Não há
aqui nenhuma prevenção a priori contra o Estado, uma vez que
ele é necessário mesmo para criar o laissez-faire, ou seja, lutar
contra os trusts e cartéis, assegurar a competição, garantir o cumprimento dos
contratos e, de forma geral, defender os direitos de propriedade. Ocorre,
porém, que o Estado é também um forte indutor de redistributivismo regressivo,
isto é, o recolhimento compulsório de recursos de todos os cidadãos, produtores
e consumidores, e o seu “redirecionamento” segundo critérios políticos
determinados. Em todos os casos de declínio conhecidos, o Estado serviu
precisamente para esse tipo de redistribuição perversa dos recursos públicos,
gerando o fenômeno conhecido pelos economistas como “crowding-out”, isto é, a
captura da poupança privada pelo próprio Estado e pelos rentistas profissionais
e sua apropriação pelo próprio Estado (e seus amigos), o que provoca
deseconomias de escala e erosão do investimento produtivo. Os grupos
politicamente mais bem articulados conseguem acesso aos planejadores e
legisladores do orçamento público, deixando ao relento os setores menos
organizados. Isso geralmente implica em concentração de renda e ausência de um
mercado interno dinâmico. Os exemplos de declínio e de estagnação coincidem,
justamente, com o que Veblen chamaria de “consumo conspícuo” das elites, em
total indiferença em relação ao conjunto dos cidadãos. Não se pense, por fim,
que tudo se faz em benefício do “grande capital monopolista” e em detrimento da
“classe trabalhadora”. Sindicatos são máquinas organizadas para criar escassez
de mão de obra e para produzir desemprego, atuando em perfeita sincronia nem
sempre funcional, é verdade com os sindicatos de patrões, com vistas a
extorquir recursos do resto da sociedade desorganizada. Viceja, nos casos
típicos de declínio econômico prolongado, uma espécie de “pacto perverso”, pelo
qual ambos sindicatos entram em conluio algumas vezes de forma involuntária ou
até inconsciente em favor de seus ganhos respectivos, repassando os custos para
o resto da sociedade. A desigualdade distributiva nem sempre é
“aristocrática”...
4 - A lei passa a não ser mais respeitada
pelos cidadãos ou pelos próprios agentes públicos:
Não acatamento da lei pelos cidadãos e pelos
próprios agentes públicos. A decadência, como já afirmado, nem sempre se traduz
em pobreza material, ao contrário, pois sociedades decadentes são, igualmente,
sistemas de relativa abundância, pelo menos para os privilegiados. Mas, a
decadência verdadeira sempre implica em miséria moral, a começar por um
sistemático, no começo sutil, depois disseminado, desrespeito à lei e às boas
normas de convivência. Uma sociedade não começa a decair com o aumento da
delinqüência comum e com a expansão da criminalidade de baixa extração, mas
justamente com o desprezo pela lei por parte dos poderosos e dos próprios
encarregados de manter a ordem. Sociedades patrimonialistas são naturalmente
mais propensas a esse tipo de corrupção moral, como evidenciado na trajetória
do império otomano, mas nem mesmo sistemas “tecnocráticos” estão imunes a esse
tipo de evolução involutiva, se é possível este tipo de trajetória. O império
chinês, com seu imenso corpo de mandarins bem treinados, talvez tenha conhecido
itinerário semelhante, antes mesmo de o país ser invadido e humilhado pelos
imperialistas ocidentais (e depois japoneses). O desrespeito à lei, ou mesmo a
contravenção pura e simples por parte dos poderosos, constituem o traço mais
visível do declínio moral de uma sociedade. Quando as suas elites, em especial
o seu corpo dirigente, recorrem a expedientes escusos, quando não a práticas
claramente criminosas, para extrair benefícios para si, pode-se constatar que a
sociedade caminha célere para a sua decadência. Não se deve, porém, confundir,
artifícios ilegais, ou no limite da legalidade, empregados por algumas elites
econômicas como caixa dois, elisão ou evasão fiscal ou ainda pagamentos por
fora como representando necessariamente sinônimo de decadência. O setor
produtivo pode ser especialmente competitivo e gerencialmente capaz, apenas que
penalizado por um Estado voraz, por dirigentes políticos de comportamento
predatório, sendo levado a utilizar-se do recurso a esse tipo de expediente
como uma forma de “defesa patrimonial”. É, aliás, o que fazem a maioria dos
cidadãos que buscam evadir o fisco, uma vez que adquiriram a consciência de que
os impostos pagos diretamente e os tributos recolhidos indiretamente não
retornam proporcionalmente sob a forma de serviços públicos. A ilegalidade se
dissemina paulatinamente na sociedade e se converte em uma "segunda
natureza” do cidadão comum e do empresário: ninguém se “arrisca” a ser
totalmente honesto, uma vez que isto representaria a inviabilidade do seu
negócio ou a “extração compulsória” seria demais onerosa no plano das rendas
individuais. Pouco a pouco, a corrupção e a contravenção se instalam em todos
os poros da sociedade e ela, sem perceber, caminha rapidamente para o que
chamamos de decadência.
5 - As elites se tornam autocentradas, focadas
exclusivamente no seu benefício próprio:
Esta é outra
manifestação do mesmo comportamento descrito acima, apenas que os meios são
absolutamente legais, ainda que ilegítimos, e redundam quase sempre nos mesmos
efeitos já referenciados no rentismo perverso e no redistributivismo desigual.
Responsáveis políticos se ocupam não tanto de legislar para a sociedade, mas em
causa própria. Os meios passam a absorver uma proporção crescente dos recursos
voltados para determinados fins. Isto geralmente se dá no setor legislativo,
mas pode perfeitamente ocorrer nos meios judiciários e, igualmente, em
corporações de ofício que se organizam burocraticamente no âmbito do poder
executivo. A representação política deixa de constituir um mandato conferido
pela sociedade para o desempenho das funções que lhe são próprias para
converter-se em um fim em si mesmo. Esses traços de comportamento não são
exclusivos da representação política, embora eles sempre se reproduzam no
estamento político. Elites rentistas, de modo geral, desenvolvem essa
indiferença em relação à sociedade, cuja simbologia mais famosa, ainda que
provavelmente equivocada , é historicamente representada pela frase de Maria
Antonieta sobre os brioches que o povo deveria comer, no lugar do pão comum.
Elites aristocráticas do ancien Régime, na França e na Rússia
czarista, foram em grande medida responsáveis pela desafeição do povo em
relação às suas elites, contribuindo para a derrocada dos respectivos regimes
políticos ao se operar um claro divórcio entre suas concepções do mundo.
O apartheid social, mais até no plano mental do que no âmbito
material, costuma ser construído por minorias ativas, nem todas elas
privilegiadas, mas sempre elitistas em relação à massa da sociedade. Por vezes,
uma elite “subversiva” se apossa do poder e passa a exibir os mesmos traços de comportamento
que o das elites antes privilegiadas, numa típica reprodução da fábula contida
em Animal Farm, segundo a qual “todos são iguais, mas alguns são
mais iguais do que outros”.
6 - A corrupção é disseminada nos diversos
canais de intermediação dos intercâmbios sociais:
O cimento mais
poderoso em todas as sociedades organizadas é a confiança não só na palavra
dada, no plano individual, mas também na moeda, na observância da lei em
caráter impessoal, no cumprimento dos contratos e, sobretudo, na certeza da
punição em caso de ações “desviantes”. O que mantém o poder de compra de uma
moeda, por exemplo, não é tanto a força absoluta de uma economia, mas a
confiança de que seu valor de face não será abalado por atos arbitrários das
autoridades emissoras, medidas intervencionistas que afetem sua liquidez ou
alguma ameaça de confisco, mesmo indireto. A incerteza jurídica por vezes
trazida pelos próprios juízes, que não se contentam em interpretar a lei,
preferindo criá-la, ou colocá-la a serviço de alguma causa “social” está na
origem do desrespeito aos contratos e, portanto, no aumento dos custos de
transação. Setores da sociedade passam a desenvolver formas próprias,
geralmente informais, de intercâmbio, que podem englobar um volume crescente de
atividades. Sociedades decadentes são, geralmente, sociedades nas quais a
informalidade recobre grande parte da população economicamente ativa e uma
fração significativa do produto social. Um Estado “extrator” pode também ser o
responsável direto pela “expulsão” do mercado formal de agentes econômicos
privados que não encontram nenhuma vantagem em se colocar à margem da legalidade,
mas que não conseguem se enquadrar nas regras existentes. Na verdade um cipoal
de regulamentos estabelecido justamente para vigiar o cumprimento de uma
legislação barroca no plano regulatório. A sociedade como um todo passa a se
acostumar com a modalidade informal de se completarem as transações e, ao fim e
ao cabo, os intercâmbios legais passam a cobrir uma fração cada vez menor do
conjunto das trocas sociais. A sociedade de “desconfiança” afeta a todos os
participantes do mercado, gerando graus crescentes de anomia e de deterioração
dos costumes básicos. A sociedade em questão está “pronta” para aprofundar seu
processo de decadência.
7 - Avanço dos corporatismos e
particularismos, em detrimento das “causas nacionais”.
A fragmentação da
representação política e social nos diversos corpos constitutivos da sociedade
cria uma colcha de retalhos de difícil administração institucional. Para que
grandes reformas estruturais se façam e toda sociedade requer, periodicamente,
adaptação às novas condições ambientais externas e às suas próprias
transformações internas, demográficas e outras, as diferentes partes da
sociedade precisam estabelecer um pacto de convivência, no qual todos cedem um
pouco para que as mudanças possam ser implementadas. A perseguição de objetivos
particularistas por grupos sociais organizados, geralmente com vistas a se
alcançar metas setoriais e exclusivas, inviabiliza qualquer “projeto nacional”
digno desse nome (ainda que essa figura seja antes um mito do que uma
realidade, pois “projetos” bem executados geralmente resultam da ação decisiva
de uma pequena elite de “iluminados”, quando não de um líder carismático
atuando como estadista). O fato é que os processos de decadência também são
caracterizados pela existência de “projetos fragmentários”, condizentes com o
perfil já fortemente sindicalizado dessa sociedade. Não é incomum a
representação política passar da dominância de próceres cosmopolitas, da elite,
mas dotados de uma visão do mundo não provinciana, para “delegados de
categoria”, eleitos por um grupo de interesse restrito (de caráter sindical,
setorial ou religioso). O processo legislativo se divide então em uma miríade
de demandas particularistas, que esquartejam o orçamento nacional e transformam
o planejamento público em uma assemblagem de partes heteróclitas. Congela-se a
possibilidade de atuar nas grandes causas, pois o mercado político converte-se
num bazar de compra e venda de projetos setoriais e fragmentários. Um indicador
fiável dessa tendência é dada por meio de consulta a um calendário-agenda: a
sociedade estará tão mais próxima da decadência quanto mais dias do ano são
dedicados a homenagear categorias profissionais...
8. Grupos sociais particulares pretendem
distinguir-se do conjunto da sociedade.
A chamada
“identidade nacional” – um conceito difuso e freqüentemente mal interpretado –
constitui um dos traços mais conspícuos da psicologia de massas. Uma sociedade
dinâmica ostenta um forte sentimento de inclusividade e de identificação com os
símbolos nacionais, sejam eles realidades históricas tangíveis, sejam eles
simples mitos criados para fortalecer o processo de Nation building.
Em qualquer hipótese, o sentimento de pertencimento – status de appartenance ou membership –
a um corpo social ou humano relativamente homogêneo é um poderoso cimento da
identidade nacional, o que não impede, obviamente, particularidades regionais,
traços étnicos ou especificidades culturais próprias a sociedades complexas,
racialmente diversas e dotadas de origens “multinacionais”. O ideal de toda
sociedade integrada e orgulhosa de sê-lo é, justamente, conseguir passar do
estágio simplesmente “multinacional” para o de “sociedade multirracial”, o que
deveria ser o objetivo de toda comunidade inclusiva, uma vez que tal
característica destrói as próprias bases de qualquer manifestação de racismo ou
apartheid. A desafeição em relação à fusão dos particularismos raciais ou
culturais no mainstream social e humano nacional enfraquece a
noção de identidade nacional e reforça a noção artificial de aparteísmo. Este
tipo de divisor precisa ser construído politicamente, uma vez que se adota como
suposto básico a unidade fundamental do gênero humano. A divisão é, geralmente,
obra de ativistas e militantes de uma causa que se julga legítima, cujas raízes
encontram fundamentação histórica em opressões seculares, que se pretende
transplantar para o presente, como forma de preservar antigas particularidades
raciais, lingüísticas ou religiosas, que já estavam prontas a se fundir no
poderoso molde nacional. A conformação política de uma cultura distinta da
nacional reforça manifestações de racismo ao contrário, pois que as propostas
são geralmente feitas para eliminar supostos focos de “racismo”. O apartheid
também pode ser construído por minorias...
9. Irresponsabilidade intergeracional, nos
terrenos fiscal ou ambiental, entre outros.
O desejo de
preservar o status quo, ou a inconsciência quanto à constante
necessidade de ajustes e adaptações às condições “ambientais”, nacionais ou
internacionais, sempre cambiantes, fazem com que gerações do presente
eventualmente atuem de maneira irresponsável em relação àquelas que as
sucederão. Historicamente, o problema sempre esteve associado à depredação do
meio ambiente e à extinção de espécies animais, alterando o equilíbrio natural
e ameaçando a sustentabilidade de sistemas econômicos inteiros.
Contemporaneamente, a questão tende a se revestir de características econômicas
bem marcadas, tendo a ver com a trajetória avassaladora do Estado moderno e sua
voracidade fiscal, não em benefício próprio, obviamente, uma vez que o Estado é
uma entidade impessoal, mas em favor de grupos ou categorias dispondo de
condições de acesso e de manipulação dos mecanismos de intervenção pública. Nos
casos mais graves, o conjunto da sociedade pode atuar de maneira irresponsável,
ao sustentar escolhas que representam uma clara preferência pelo bem-estar
presente, em detrimento do amanhã. Seja nos esquemas de previdência social,
seja nas instituições educacionais, ou ainda em matéria de déficits orçamentários
e dívida pública, opções erradas e a visão imediatista dos responsáveis
políticos, sustentados pela inconsciência da maioria, criam pesadas hipotecas
de médio e longo prazo que deverão, em algum momento, ser resgatadas pelos
sucessores, aqui entendidos como o conjunto da sociedade de uma ou duas
gerações mais à frente. O declínio pode até não ser visível no próprio momento
das decisões, mas o que se está fazendo, na verdade, é “contratar” a decadência
futura.
10. Degradação ética e moral, independentemente
de “progressos” técnicos.
Edward Gibbon, em
seu justamente celebrado História do Declínio e Queda do Império Romano,
tende a ver a decadência de Roma como o resultado da perda de “valores cívicos”
por parte dos cidadãos do império, a começar pelos patrícios, que delegaram aos
bárbaros tarefas que eles deveriam ter assumido diretamente. Ele também atacou
a influência do cristianismo, como possível fator de afastamento do antigo
espírito marcial e guerreiro, que tinha feito, no início, o sucesso da república
e do império. Seja como for, a perda de objetivos claros quanto ao futuro,
certa resignação em face das dificuldades do presente e a busca de prazeres
imediatos em lugar da frugalidade produtiva e empreendedora podem ser sinais
precursores da decadência. Curiosamente, nenhum dos exemplos históricos tidos
como ilustrativos ou emblemáticos desse tipo de processo pode ser considerado
um insucesso absoluto na cultura ou nas artes. O vigor da produção cultural
continua a todo vapor no momento mesmo em que essas sociedades passam a
enfrentar problemas na economia e na inovação. Não há um elemento singular ou
único que “anuncie” a decadência, mas um conjunto de comportamentos sociais e
de reações que indica forte deterioração da solidariedade social e uma crescente
anomia em relação aos valores básicos da sociedade. A falta de confiança nas
instituições políticas e a forte desconfiança das motivações de outros grupos
sociais fazem com que líderes e liderados não mais se sintam comprometidos com
o mesmo conjunto de valores, passando a ocorrer manifestações de introversão e
de egoísmo que logo superam a identificação com a pátria e a nação. Em síntese,
existe um “espírito” de decadência quando os setores produtivos, em especial os
empresários mais politicamente ativos, se mostram resignados ante a presença
avassaladora do Estado, que lhes tolhe os movimentos, impõe regras e lhes
retira a substância da atividade econômica, que é o lucro e os excedentes para
investir. Existe decadência quando os intelectuais e os universitários, de uma
forma geral, se conformam ante o culto à ignorância exibido por certos grupos
sociais ou líderes supostamente carismáticos ou “salvacionistas”. Existe
decadência quando autoridades nacionais, a começar pelos encarregados da
preservação da ordem jurídica e institucional, deixam de lado suas obrigações
profissionais para cuidar de prosaicos interesses pessoais, pecuniários antes
de tudo. Existe decadência quando o cidadão comum não vê qualquer motivo para
preservar o patrimônio coletivo, demonstrando total inconsciência quanto ao
dever de respeitar a herança das gerações precedentes e a necessidade de
repassar às que seguirão a sua própria um ambiente melhor do que aquele
recebido dos ancestrais. Em suma, os sinais materiais, ou externos, da
decadência nem sempre são os que contam na avaliação dos “progressos” dessa
inacreditável marcha para trás na jornada das sociedades. A insensatez quanto
aos rumos da história também se manifesta, antes de tudo, por uma pura e
simples inconsciência. Manuais práticos de decadência podem ser um preventivo
útil na inversão da trajetória. Basta saber consultá-los.
Retrato da sociedade humana atual
Não há necessidade
de ser um especialista para notar a ocorrência de tais itens na sociedade atual
afinal a sequencia de escândalos no Brasil e no mundo corroboram para este
sentimento nefasto e degradante. Nos últimos anos tivemos conhecimento de
vários crimes financeiros cometidos pelos principais atores de Wall Street e de
outros centros econômicos pelo mundo, tais fraudes financeiras causaram a crise
econômica pela qual o mundo e especialmente a Europa passam. O nível de fraudes
atingiu patamares inaceitáveis, especialistas ouvidos pela CBS, The New York Times e a pesquisa
do grupo Gallup reforçam a teoria de que a corrupção corporativa é uma epidemia
mundial, já que 2 em cada 3 adultos ao redor do globo acreditam que atividades
fraudulentas estão difundidas nas corporações de seus países. O mais assustador
é que a pesquisa do Gallup revela que 60% dos residentes dos Estados Unidos e
do Canadá consideram a corrupção algo comum, enquanto que, em países em
desenvolvimento, os percentuais são mais altos, como na África subsaariana,
onde 76% sentem que a corrupção está presente nas corporações de suas nações. Pelo
menos na Ásia, a percepção é contrária. Apenas 13% dos entrevistados em
Cingapura e 10% na Indonésia acreditam que a corrupção seja algo presente e
corriqueiro nas empresas. Nos países da antiga União Soviética, essa porcentagem
varia bastante, de 28% na Geórgia a 87% em Moldova. No Brasil, o índice é de
73%. Casos como o do banqueiro ítalo-brasileiro Salvatore Cacciola estão aí
para chancelar esse número. O estudo ouviu mil pessoas em cada um dos 140
países incluídos na pesquisa e acaba por concordar com a opinião do Banco
Mundial de que a corrupção é um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento
social e econômico.
Não é preciso ser um gênio também para perceber que há corrupção na política, na polícia, na justiça, na administração pública, na educação, nas diversões públicas, na família, na economia, no Direito, nos medicamentos, nos discursos e argumentos pseudocientíficos, nas igrejas, nas atividades empresariais etc. O problema é que parece que os seres humanos no aprenderam ainda que estes são sintomas claros da morte de muitos impérios poderosos. Corrupção do Latim corruptio= alteração ou movimento substancial para a destruição da substância. A corrupção é o mal social maior porque destrói, anula a própria sociedade; daí sempre ter sido essencialmente um crime em toda e qualquer civilização.
O filósofo alemão Friedrich Nietzsche dizia em Genealogia da Moral que; “Pela maneira como uma dada sociedade encaminha seus costumes, sua moralidade, se pode saber muito acerca de sua saúde”. Enfatiza que não é o desregramento moral o fator desagregador de uma sociedade, mas pela análise da moral, dos costumes, se pode saber acerca da força de uma dada sociedade.
Não é preciso ser um gênio também para perceber que há corrupção na política, na polícia, na justiça, na administração pública, na educação, nas diversões públicas, na família, na economia, no Direito, nos medicamentos, nos discursos e argumentos pseudocientíficos, nas igrejas, nas atividades empresariais etc. O problema é que parece que os seres humanos no aprenderam ainda que estes são sintomas claros da morte de muitos impérios poderosos. Corrupção do Latim corruptio= alteração ou movimento substancial para a destruição da substância. A corrupção é o mal social maior porque destrói, anula a própria sociedade; daí sempre ter sido essencialmente um crime em toda e qualquer civilização.
O filósofo alemão Friedrich Nietzsche dizia em Genealogia da Moral que; “Pela maneira como uma dada sociedade encaminha seus costumes, sua moralidade, se pode saber muito acerca de sua saúde”. Enfatiza que não é o desregramento moral o fator desagregador de uma sociedade, mas pela análise da moral, dos costumes, se pode saber acerca da força de uma dada sociedade.
Principais causas da decadência do
Império Romano
A fragilidade da
economia, a desigualdade social, a corrupção do sistema e a politização
do Exército abalaram o Império Romano. Com o fim da expansão territorial, o
número de escravos diminui, afetando diretamente a produção agrícola e o
comércio. O Império, que vivia basicamente dos tributos cobrados, é obrigado a
emitir moeda, desencadeando um processo inflacionário. A redução do contingente
militar facilita ainda mais a penetração de povos bárbaros. A crise é acentuada
pela popularização do cristianismo, combatido pelos romanos por ser monoteísta
e negar a escravidão e o caráter divino do imperador. Um descontentamento com
os altos impostos para sustentar o grande número de funcionários e militares,
necessários em território tão extenso, era preciso muito dinheiro, que era
arrecadado do povo. Esse mesmo dinheiro também sustentava o luxo e a corrupção
dos governantes. O quase desaparecimento da moeda romana como a produção
diminuiu, faltavam produtos para vender; assim, as importações aumentaram e, em
consequência, grande quantidade de moeda saía e não voltava. Desorganização
política e militar: a disputa pelo poder, a corrupção e o descuido com a
administração era constante. Cada exército obedecia mais a seu general do que
ao imperador. Além disso, o assassinato de imperadores era frequente. Roma
provocou sua própria queda permitindo a deterioração da economia, as lutas
internas, a fuga de capitais, corrupção administrativa e para dar o golpe de misericórdia
a invasão dos bárbaros Em 476. Já viram este filme? A queda do Império Romano
do Ocidente marcou o fim da Antiguidade e o início da Idade Média. Que continuou
a cometer os mesmos erros vistos até hoje.
Trecho retirado do
livro: Corrupção e morte da política: Análise de uma patologia social de Orlando
Lyra de Carvalho Jr
"Pretendemos, neste
artigo, analisar alguns aspectos do fenômeno da corrupção política na
perspectiva daquilo que Michel Foucault chamou de práticas e relações
de poder (2000, p.21), isto é, sob o ângulo da anatomia dos hábitos e
costumes políticos (1994, p. 208) que alimentam a corrupção em geral. Se
considerada sob esse ângulo, nota-se logo que a corrupção se caracteriza
pela persistência e capacidade de renovação como fenômeno recorrente no mundo
político. Tal persistência, a nosso ver, foi bem descrita pelo sempre
metafórico presidente Lula: “A corrupção é como petróleo, quanto mais se
investiga, mais aparece”. Talvez seja por isso que a corrupção, quão novo fênix,
está sempre pronta a ressurgir da poeira dos escândalos e a sobreviver intacta
às vagas da denúncia. Muitos chamam isso de impunidade. Realmente, sob a
perspectiva jurídico-legal, o combate à corrupção, hoje, tem muito de
espetáculo e pouco de condenações, bastando para isso constatar que, até o
presente momento, político algum foi condenado por corrupção pelo Supremo
Tribunal Federal. Por exemplo, das 245 pessoas presas em dez operações
realizadas pela Polícia Federal entre 2003 e 2004, 64 foram julgadas, mas só
duas continuam na cadeia. Esse fato inspirou a comparação histórica de José
Murilo de Carvalho: “Getúlio saiu da vida para entrar na história”. “Hoje, os
corruptos saem da história para entrar na vida”."
Conclusão
Meu pai costumava
dizer “O mal do corrupto é que ele começa a roubar 10% e deixar 90% depois vira
vício e rouba 90% e deixa 10% e por causa disso muitos pagam o preço da sua ganância”.
Sim talvez tenhamos que admitir que não há solução para a corrupção, mas
pode-se sonhar com pelo menos baixá-la para níveis “aceitáveis” ou que não
comprometa tanto os serviços essenciais a uma sociedade, então assim como um
predador deixa sempre condição suficiente para sua presa continuar a existir o
corrupto teria que fazer o mesmo ou quem sabe, poderia ser criado um mecanismo idêntico
ao utilizado contra animais que matam só pelo prazer de matar, tais animais são
caçados e abatidos tal ato devolve o equilíbrio entre predador e presa. Então a
solução seria localizar exatamente o foco da corrupção e eliminar ou anular
seus tentáculos maiores deixando pelo menos os 90% para a maioria. Presente em todas as civilizações desde primórdios, acredito que a corrupção é um
adversário feroz para o nosso futuro neste planeta pois ela desassocia forças,
corrompe mente e separa em vez de unir a maioria, se vencermos tal “doença
social” poderemos nos unir para o planejamento do que realmente interessa a
nosso própria vida e das gerações vindouras afinal hoje os seres humanos
consomem, a cada ano, um montante de recursos naturais 50% superior ao que a
Terra pode produzir de forma sustentável nesse mesmo período segundo dados da ONG
WWF. De acordo com um relatório "Living Planet" a Terra leva um ano e
meio para repor todos os recursos que a população mundial consome a cada ano.
Precisamos urgentemente cuidar do nosso planeta ou ficaremos marcados como a
geração incompetente que destruiu o futuro da humanidade.
"Isto é lógico: as necessidades de muitos,
sobrepujam as necessidades de poucos, ou de um." - Star Trek II.
Fontes:
Corrupção e morte da política: Análise de uma
patologia social - Orlando Lyra de Carvalho Jr.
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